sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Perdão

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Senti-me débil, lúgubre como caminhadas de almas escondidas que choram sem serem sequer vislumbradas. À medida que avançava, um pé depois do outro, sentia corvos afastarem-me o cabelo da face e borboletas sobrevoarem-me a cabeça. Não devia ter feito tal coisa - dizia eu no silêncio daquela noite invernil. Passeei por jardins de respirações e amores cantados ao ouvido, calmos como gotas de água caídas nas pedras da calçada. Recuei para pedir perdão, mas não fui sequer ouvida, pois a dor não se apaga no calor de meros vocábulos proferidos naquele mesmo instante. Voltei a caminhar em gesto de saudade, desfazendo malmequeres, já sem sentir as mãos da geada que se insatalara. O céu estava enevoado e caía neve como corações despedaçados que se instalam na insipidez do azul-celeste do céu. E eu quis dizer-te aquela frase que me proferiste numa noite no meu quarto, mas não consegui. Riste-te quando falei e eu não queria um monólogo apenas, mas sim que me dissesses que me perdoavas. Já senti essa emoção que te consumiu muitas vezes, acredita; sentiste-te leve como rosas desfeitas e poemas deixados cair ao luar, quase tão fraco como chuva que inunda a cidade e injustiçado como a única e mais bela especiaria que nunca é provada. Sentei as pernas cansadas num banco de jardim e senti o aroma a beijos roubados na doçura de um olhar e a abraços calorosos em noites frias como esta. Quis chamar-te para perto de mim, mas não pude e tu também não virias. Desculpa.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Noites relembradas

Passados deixados cair na leveza do rio como pedras que imploram para jamais serem levantadas novamente. Emoções que fingo ter esquecido, mas que me continuam ávidas na memória e que me iludem a cada dia que tende em passar. Triste por relembrar um passado longínquo que não devia mais voltar. Folhas de sobreiros que caem sem se ouvir, pétalas de rosas que não se vêem dançar ao sabor da ventania. Invisível, é tudo aquilo que eu sou para ti; noites passadas sentada e recostada sobre a neve que cai de madrugada a chorar lágrimas de sangue. Noites que pensava ter esquecido, mas que regressam como andorinhas que migram na primavera, gritos inaudíveis e lágrimas que não se vêem. Fogo que arde e me queima o peito, geada que me entorpece a alma que já não tenho, mas sinto. Resta-me pedir aos céus para que tudo o que sentira por ti não volte, porque eu não sou pólen que vai e regressa nem chávenas de café partilhadas e bebidas a dois. Sou um longo poema decorado, uma pequena vela acesa,  mais bela quando te vais e mais forte a cada dia em que o Sol nasce. E agora chove.

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segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Dois pássaros livres

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Deitados lado a lado como dois pássaros livres que cantam música juntos; adormecidos como duas almas que só repousam no descanso de um sonho; aquecidos como lenha que arde sem  sequer darmos conta. Dormimos juntos e sonhámos na preciosidade de uma noite passada no calor um do outro. Eram nove e vinte e dois e tu despertaste-me na surpresa de um beijo. Perguntaste-me se tinha dormido bem, eu afirmei com a cabeça e retribui-te a questão. Passei toda a noite acordado a admirar-te. Sabe-me tão bem saber que não tenho de adormecer para sonhar contigo - disseste-me sorrindo e acarinhando-me o pescoço, finalmente. Abracei-te e fechámos ambos os olhos, deixando-nos absorver pela magia das cámelias e magnólias que se vislumbravam da janela da sala. Cegos e sem limites como crianças que correm sem destino aparente, assim estávamos nós. Somos segredos de lábios entreabertos, doçura de corações encontrados à beira-rio e corpos sem chão unidos por laços de afeto. E assim passamos as nossas vidas, salvaguardados na paz um do outro.

domingo, 17 de fevereiro de 2013

Dançar ao luar

Sentei-me na estrada ao luar, no preciso momento em que tu desapareceste no céu enevoado e cinzento. Deixaste-me na frieza de breves palavras escritas nas estrelas desta noite. E eu escutava a chuva cair e deixava-me cair com ela. Estava fria, fraca, pesarosa. As árvores tremiam a cada rajada de vento, as flores voavam, leves como penas, e a água inundava as ruas da cidade. Estava descalça e sem consolo, longe de mim e de ti, cada vez mais. Acendi um cigarro e cruzei as pernas, levantei-me e dancei, fi-lo como se não houvesse mais nada de grandioso nesta vida. Percorri toda a rua em piruetas repletas de angústia e em pliés há muito ensinados. Abracei-me e deslizei no chão molhado, como desertos que anseiam por uma gota de água. Cantei e despi-me naquela noite à medida que abraçava a dança como único consolo. Só parei quando vi a Lua sumir-se e vislumbrei o brilhante Sol que se instalava, agora, no conforto dos céus. Calcei-me e voltei a casa alquebrada, exausta. Agora sorridente e sem vestígios de lágrimas deixadas cair ao som de poemas escritos pelos céus. E dancei, porque dançar é o fogo nestas noites mórbidas de Inverno.

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terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Despedida


Senti o calor das trevas, o piso molhado que só se pisa no Inferno e as lutas entre almas loucas de saudade. Senti-me lúgubre e com uma vontade imensa de fazer parar o tempo, como que por magia. Tentei sentir-me, mas não conseguia, estava demasiado gelada para tal. Entre o bizarro pipilar noturno dos pássaros e a escuridão daquela noite, deixei-me derreter entre paredes repletas de contos e poemas há muito decorados. Caí no chão e apreciei as nuvens e a Lua, e quase o Sol que não tardava a nascer para iluminar a rua. Não conseguia despedir-me de ti, ainda não me tinha acostumado à dor de o fazer. Antes éramos lindos jardins de magnólias e agora somos apenas palavras ausentes de nós mesmas, incapazes de as proferir. Naquela noite senti-me um pássaro, daqueles que quebram uma asa e não voam mais, um céu cinzento em dias que trovejam, uma vela apagada e um simples pedaço de mar. Oh, diz que me levas contigo.

domingo, 10 de fevereiro de 2013

Cinco da madrugada

Estava triste, consternada. Era noite de Lua Cheia e nem isso me consolava. O cigarro apagara-se e o copo de sumo estava caído no chão. Sentia-me fria, gelada mesmo. Tinha medo e vontade de lutar ao mesmo tempo e não sabia qual destes escolher. Sentia-me doente, combalida, débil. O tempo parecia não passar. Bateste-me à porta como se pressentisses que eu não estava bem, entraste no quarto e escondeste-me nos teus longos e fortes braços. Chorei e solucei umas cem vezes no teu peito. Não me perguntaste o que se passava, nem sequer me cumprimentaste. Eu gostei disso. Conversas de silêncio e noites de amor, tudo aquilo que nós somos. Caímos no chão os dois, perto da janela. Sentimos a Lua em beijos que me davas por todo o corpo. Senti as estrelas e o céu, a chuva e o chão molhado. Deitaste-me na cama e saíste, deixando-me nos silêncio de um beijo na testa. No quarto ficou o teu cheiro a bondosidade e a cinco da madrugada. Cheirava a poesia, a poemas verbalizados de amor. Cheirava a ti e a mim. A nós. Nada mais.

     

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Para onde?

Gritei e senti que não era suficientemente audível. Chorei e jurei para nunca mais. O café já esfriara havia muito e o calor já desaparecera de nós próprios. O céu estava escuro, repleto de fantasmas que anunciavam o terror e a pusilanimidade. O fim estava próximo e tu estavas cada vez mais longe. Ouvi relâmpagos e chorei ao som da chuva, gritei por ti e perdi-me naquela janela. Inundei a cidade com as minhas lágrimas e senti o Inferno a meus pés. O cheiro do teu perfume assoberbava-me os cabelos e eu caía cada vez que pensava que estavas prestes a ir-te embora. "Não vás", tartamudeei já quase sem fôlego. "Não posso deixar-te ir assim, eu vou contigo". Abraçaste-me e sentiste o meu cheiro a Inverno, beijaste-me e sorriste. Sempre sei dizer nada. Saltei para os teus braços e deitaste-me contigo na cama. No dia seguinte fugimos. Para onde? Ainda não sabemos.