domingo, 7 de julho de 2013

Adoro-te


Ela tinha os cabelos escuros como os céus nas noites de dezembro e era pequenina. Trazia uma doçura de criança no seu sorriso quase perfeito e os seus olhos negros contavam mil e uma histórias aos morcegos de madrugada. Acompanhava-me já há muito e passávamos os dias de verão sempre juntas. Naquele verão, eu não queria rir-me com ela nem tão-pouco passar tempo com alguém senão as paredes que comigo choravam em cada lúgubre anoitecer. Mas ela sempre fora mais forte do que eu e conseguira fazer com que pisasse outro chão senão o do meu quarto e com que sorrisse quase tão discretamente como quando o Sol beija a Lua no inverno. E ela era mesmo isso, uma alegria tão discreta, mas sempre tão bonita. Oh, mas ela também chora. Eu sei que não me diz quando o faz com as estrelas e que prefere fazer-me sorrir do que saber que eu a vejo esboçar uma espécie de sorriso meio-escondido, meio-desfeito. Naqueles dias, assim como em tantos outros, fora ela quem me fizera acreditar que a vida é tão bela quanto os poemas que os rouxinóis cantam e eu adoro. Obrigada por gostares de mim quando eu já nem de mim gosto - dizia-lhe enquanto ela dormia. Talvez não tenha sido o verão mais belo de sempre, mas foi aquele em que aprendi o quão bom é tê-la por perto. Agradeço-lhe por me desenhar os sorrisos mais bonitos e, oh, peço-lhe que me deixe desenhá-los a ela também numa daquelas noites de inverno em que eu sei que precisa mas não me conta. Gosto mais dela que da Lua.

terça-feira, 2 de julho de 2013

A melodia de uma lágrima


Tudo o que se ouvia na cidade era o som do violino que tocava, no quarto que era quase mais vazio que os céus. Tinha os cabelos escuros e compridos e a subtileza com que estes lhe preenchiam os ombros tornavam-na um pedaço belo de jardim. Os seus grossos e enigmáticos lábios - de quem nunca é beijado pelo mar - davam-lhe uma elegância imperfeita que poucos compreendiam. Tocava sem cessar aos pardais há horas, fechava os olhos e, de quando em vez, chorava. Tinha medo de viver, porque viver agora somente a magoava. Sentia os ossos quebrarem-se-lhe sempre que dançava pela sala num suspiro ao implorar pela sua alma de volta. Mas ela não parecia parar de chorar... Tocava mais uma vez e o movimento dos seus braços era quase tão belo como o luar. A dor parecia movê-la e fazer com que ela não parasse de tocar até amanhecer. Não se sentia bem, queria desaparecer para onde os pássaros lhe beijassem os poemas que escrevia e pudesse chorar durante dias a fio. Talvez não fosse apenas uma simples rapariga, talvez fosse um sorriso transformado numa mágoa que parecia terminar só no Inferno. Era, agora, nada mais que um céu sombrio e tenebroso. A pele parecia-lhe mais pálida que  o habitual ao espelho e os seus olhos já não mais brilhavam quando o vento abria as janelas numa espécie de jogo de forças. Era capaz de sentir a dor de quem é despedaçado aos poucos, porque, afinal, não dói pouco perder o coração. Não pedia que ele a amasse, já só queria aprender a odiá-lo. E, mesmo assim, não parava de tocar.